Seria fácil encontra-lo, eu tinha a mais plena convicção.
A descrição não dava margem para muitas dúvidas: um metro e
noventa, cento e dez quilos, pele alva com bochechas rubras, roupas vermelhas
de manga comprida e com detalhes (pele?) brancos nas extremidades; usava um
gorro vermelho e dirigia um carro aberto com tração dianteira que, dizem, corria
tanto que podia até voar.
Enquanto esperava (minhas fontes diziam que ele passaria
pelo ponto de controle por volta da meia noite), resolvi fazer uma “boquinha”:
refrigerantes, sementes (castanhas, nozes etc), carnes, peru, frutas típicas do
inverno, arroz com lentilha, sem lentilha, com os mais diversos tipos de
combinações.
De sobremesa chocolates, bolos, doces, sorvetes, tudo muito
bem feito e por várias pessoas.
À medida que se aproximava o horário percebi que as crianças
ficavam mais excitadas e os adultos impacientes. Resolvi me sentar, conversar
fiado e comer mais um pouco (cada vez que olhava para a mesa via um petisco
diferente e com aparência melhor, além de ouvir constantemente frases como “come
um pouquinho... já provou este? ... nossa, este aqui está tão bom...”)
Meia noite. Olho para o lado e não acho o suspeito que
procurava. Como eu poderia não encontrar um velhote com as barbas já brancas e
carregando um saco nas costas?
Olho para cima, para frente, viro o pescoço e resolvo me
levantar, mas não consigo.
Alguma coisa me prendia fortemente à cadeira, mas não eram
laços nem cordas.
Uma força incrível parecia colaborar com a gravidade e
dificultava qualquer movimento que eu tentasse fazer. Algum tipo de pressão
magnética? Algum raio ou veneno?
Precisava ter calma e quando já perdia as esperanças resolvi
abaixar minha cabeça e foi nesse exato momento que o mistério teve fim.
Abaixo da minha cabeça pude ver algo que não me pertencia
antes, mas que agora havia se incorporado como se eu fosse sempre daquele
jeito. Ele estava ali, exatamente ali.
Chegou sorrateiro, de mansinho e não me deu sequer chance de
reação, mas agora ele também dali não sairia.
Ele estava em minha barriga, impedindo meus movimentos e eu
não percebera.
Acreditem vocês ou não, mas a verdade é uma só: Eu comi o
Papai Noel!